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A justiça é o pão do povo.
Às vezes bastante, às vezes pouca.
Às vezes de gosto bom, às vezes de gosto ruim.
Quando o pão é pouco, há fome.
Quando o pão é ruim, há descontentamento.
(Bertold Brecht)
A população deve ter visto na imprensa, inclusive na página institucional do Tribunal de Justiça no Jornal "O Correio da Paraíba", a criação de 100 cargos comissionados de assessor de juiz para aquele Órgão. Encaminhar-se-á o projeto de lei à Assembléia Legislativa para a aprovação.
É evidente o preconceito da corte de justiça estadual contra o concurso público. Fere o princípio da razoabilidade e proporcionalidade a criação de cargos de assessor, quando o tribunal carece de servidores efetivos para as mais variadas funções.
É bom lembrar que o mesmo tribunal foi obrigado a devolver mais de 500 servidores por inequívoca ilegalidade. Era a amoralidade norteando os quadros funcionais do Poder Judiciário o qual, diga-se en passant, é o órgão encarregado pela Carta da República de fazer cumprir as leis.
Doutra banda, havia outrora uma lei estadual que criava os cargos de “assessor de segurança”, onde se permitia que os desembargadores escolhessem livremente seus agentes de segurança, foi declarada inconstitucional pelo STF, numa ação da lavra do Procurador-Geral da República, em representações das procuradorias da República e do Trabalho na Paraíba.
Entendeu o Supremo que tais funções não se coadunavam aos pressupostos de cargos de confiança.
Até onde sabemos, nada obstante a decisão do Excelso Pretório, o tribunal paraibano apenas mudou a nomenclatura desses agentes de segurança, estando agora contratados temporariamente por excepcional interesse público. O Ministério Público do Trabalho propôs representação contra o TJ neste caso, e esta adormece no CNJ, sendo adiado o seu julgamento por mais de 4 vezes.
Não há nenhum vício de antijuridicidade na criação de cargos em comissão, até porque estes são necessários ao melhor funcionamento de qualquer setor da atividade pública. Contudo, os cargos comissionados são, pela própria natureza, destinados às funções estratégicas e muito singulares, as quais exijam atributos especiais e pessoais para o seu exercício. Isso não se aplica absolutamente ao mister de assistente de juiz de primeira instância.
Qualquer concursado, bacharel em Direito, dispõe de condições para exercer a assistência jurídica do juiz, sem prejuízo algum à administração da Justiça, e ainda com maior estabilidade, pois não há o risco de demissão ad nutum.
Não é por demais frisar que o nepotismo cruzado reina soberanamente nas instituições públicas. Sabemos que os parentes de autoridades de distintos poderes, transitam livremente nos cargos comissionados, os quais com a fúria sangüinária de um Vlad Tsepesh, ocupam o espaço de quem realmente teria aptidão para exercer o ofício.
É verdadeiro o argumento do TJ de que o projeto de lei é “à prova de nepotismo”, pois impede a nomeação de parentes. Isso não evita outras manobras como o empreguismo e o fisiologismo, admitindo os amigos, os amigos dos amigos, os compadres, os padrinhos de fogueira, os conterrâneos etc.
A postura mais retilínea para a investidura em cargos públicos há de ser aquela prevista no art. 37 da relegada Constituição Federal, qual seja o concurso público. Aliás, isto se coaduna com os princípios norteadores da adminstração pública, nomeadamente à impessoalidade, à legalidade e à moralidade.
Ouso arriscar que o projeto de lei do TJ é inconstitucional, isso porque estarão habilitados para o cargo de assessor, acadêmicos de Direito e bacharéis. Ora, quem é estudante detém ainda nível médio (apenas o segundo grau completo) e não preenche os requisitos naturais para ocupar o cargo de assessoria judicial.
Por dever de Justiça, reconheço que os juízes de primeiro grau, verdadeira e legítima base do Poder Judiciário, necessitam de auxiliares. Renego apenas a forma escolhida pelo TJ para suprir a lacuna, burlando ditames constitucionais.
Em momentos desses, a Argentina me faz inveja.Bastou a presidenta Cristina Kirchner retaliar a greve dos produtores rurais, para a população invadir as ruas com panelas nas mãos e, às batidas, protestar. Esses mesmos protestos já derrubaram presidentes naquele país.
Cá, resta-nos somente assistir a nomeação dos novéis assessores, sem paneladas, sem protestos, de cabeça baixa, na mais pura condição de vassalos diante dos augustos voivodas.
Artigo retirado do portal Wscom – www.wcom.com.br
Eduardo Varandas Araruna
eduardovarandas@hotmail.com