THAÍS FONSECA
"Escutei o tempo todo a discussão dos bandidos, que estavam decidindo como me matariam. Pensei em cortar os pulsos porque não queria morrer nas mãos deles". Essa é lembrança dos momentos de medo e tensão que viveu o oficial de Justiça Fábio Pereira da Cunha, vítima de um seqüestro, na tarde da ultima sexta-feira, na Vila Cruzeiro, no Complexo de Favelas da Penha, Zona Norte da capital, dominada pela facção criminosa Comando Vermelho (CV). Fábio contou que durante todo o tempo em que ficou na mão dos bandidos, tentou manter a calma, mas o desespero veio a tona quando, ao escutar conversas dos traficante, soube que seria morto e de maneira impiedosa. —Ouvi quando telefonaram para um homem com apelido de Mica (Paulo Roberto de Souza Paz – chefe do tráfico da Vila Cruzeiro) e perguntaram como deveriam me matar.
Não sabiam se iriam me "picotar" ou se me colocariam em pneus — relatou o oficial de Justiça, se referindo ao modo cruel que bandidos costumam usar para matar suas vítimas, chamado sarcasticamente de microondas. A vítima, entrevistada ontem pelo Jornal Povo do Rio, contou o que de fato aconteceu nos momentos em que esteve sob o poder dos bandidos. Diferente do que foi divulgado pela imprensa no dia seguinte ao crime, Fábio não foi liberado após ter apenas o relógio roubado.
De acordo ele, pouco depois do meio-dia, quando ele chegou à Penha para entregar uma intimação em nome da Justiça Fazendária, foi abordado por dois elementos armados com uma pistola em uma motocicleta. De acordo com Fábio, eles queriam saber o que fazia ali. Ao se identificar como oficial de Justiça, que estava indo entregar uma intimação, a vítima foi rendida e levada para um barraco no interior da Vila Cruzeiro. — Estou traumatizado! Nunca imaginei como seria o sentimento de medo por quase ter morrido, como estou sentindo agora. Só sabe o que é quem sofre uma agressão psicológica como essa — revelou Fábio.
Em meio a muitas discussões entre os criminosos, Fábio acabou solto, após permanecer cerca de quatro horas em cativeiro. Angustiado, ele fez o que toda vítima deve fazer ao sofrer uma agressão, e foi correndo para a delegacia do bairro (22ª DP) registrar a violência que viveu. — Na delegacia fui informado que o Mica é o chefe do tráfico na favela. Segundo a polícia, eu só não fui morto porque os bandidos sabiam que a polícia teria que fazer uma operação para prender ou matar o Mica para dar uma resposta a sociedade — alegou o oficial, que disse nunca mais pretender voltar ao local. Ainda segundo a vítima, embora a favela esteja tomada pela Polícia Militar, não foi percebida nenhuma presença policial nos momentos em que entrou e saiu da comunidade.
Desde o último dia 18 de agosto o Batalhão de Operações Policias Especiais da PM (Bope) ocupa a Vila Cruzeiro e o posto policial no interior da comunidade. A medida foi uma decisão da Secretaria de Estado de Segurança Pública, para garantir a segurança durante operação da Polícia Civil, realizada no dia seguinte por 400 agentes, que encontrou o local do cativeiro de três chineses e do vice-embaixador do Vietnã, seqüestrados no Morro do Corcovado.
Fonte: Jornal O Povo On line